Pesquisar este blog

domingo, 12 de dezembro de 2010

Enchente na baixada: evento natural, lógico e necessário.

Entra ano e sai ano, é a mesma coisa: enchentes no verão, as mesmas notícias, as mesmas imagens, as mesmas estórias, as mesmas reclamações, os mesmos prejuízos. Por que as pessoas ainda não perceberam o óbvio? O que queriam que acontecesse numa baixada impermeabilizada? Os especialistas dizem que são terrenos “argilosos”; ou "barrentos" - como diz o povão. A argila não permite que a água se infiltre. Isto é, se ela conseguir passar as barreiras de asfalto e cimento - igualmente impenetráveis - que cobrem a maioria das estradas, calçadas e residências das cidades em terras baixas!. Descobriram recentemente, um tipo de piso “poroso” - que poderia ajudar a drenar uma determinada região. Mas, e se só tiver barro por baixo? Vai dar no mesmo: a água vai continuar presa!.

Hominídeos primitivos, que habitavam próximo das águas, faziam a coisa certa: construíam suas casas em locais mais altos do que o nível do mar e das enchentes periódicas: eram as palafitas. Os engenheiros já existiam naquele tempo. Já sabiam que não teria nenhum sentido querer enfrentar um fenômeno milenar que faz parte dos sistemas de circulação da água - seja através de nuvens, de rios, do solo, de marés, de lençóis freáticos. Tudo bem, que o lixo contemporâneo pode atrapalhar, em alguns casos, e dificultar o “fluxo” - mas a maré precisa estar “baixa”! Caso contrário, com maré alta, não existirão valões ou canais concretados (na verdade são rios assassinados), que possam dar conta do recado. O Brasil possui experiência antiga nessa área e pode "exportar" o seu saber fazer. Os amazônidas e pantaneiros não brigam com as enchentes, eles "convivem" com ela. O piso da casa é móvel e o "caboclo" vai ajustando a altura, conforme sobe a água, até chegar perto do teto. Poderia ser um "conjunto flutuante" que subisse, em tubos fixos, tudo ao mesmo tempo, feito com fibra de bananeira, carbono ou algum material similar, vegetall ou não. Quantas fibras diferentes temos em nossas florestas esperando alguém para pesquisá-las? Estão testando agora novos materiais para serem usados na construção de aviões e proteção de cargas. É uma boa dica para quem quer inovar em opções de estruturas para edificações.

Será que vamos continuar a "desmanchar morros vermelhos" - e acelerar a velocidade dos ventos - para fabricar tijolos? Por que os "tijolos" ou placas não são padronizados e fabricados com material de reciclagem inerte e seguro? Fora isso, tem um segredo ecológico, ligado aos serviços ambientais: é que a água também precisa "parar" algum tempo nesses locais, para renovar os estoques de proteína viva.


Em todo Brasil, especialmente no litoral - existiam muitas lagoas e brejos que serviam como "berçários sazonais" - permitindo que uma parte da água transbordada - ficasse depositada. Uma outra parte, voltava para o mar, com "tranquilidade", ou para grandes rios. Não havia tanta erosão do solo, porque a vegetação ciliar (o nome ciliar, vem de cílios - que protegem os nossos olhos, assim como as florestas não deixam cair terra dentro deles: assoreamento).


Essa mata marginal serve como barreira de contenção natural. O mesmo acontece com os manguezais e suas tramas de raízes. Muitas espécies aquáticas precisam desses espaços "alagados" para "criarem seus filhos". É como se fossem creches, onde há um ambiente seguro para quem é tão pequeno ainda, e não está devidamente preparado para "viver a vida entre adultos". Quando vem nova cheia, os "adolescentes" já podem sair para enfrentar o mundo e novos adultos entram, outra vez, para "desovar" e "renovar" a criançada. É isso que garante boa parte dos peixes, crustáceos e moluscos que estão em sua mesa e nos melhores restaurantes do planeta. É claro, que com uma ajuda indispensável dos recifes de corais (infelizmente, boa parte deles, já ameaçada), das praias (onde vivem os muitos organismos que alimentam os grande peixes) e costões rochosos (idem). Mas o que fizemos no continente: aterramos tudo! Rua das Marrecas - no Rio de Janeiro: muitas marrecas mesmo (aos milhares). Fora outras espécies de outras ordens zoológicas! Quantas vidas vivem nessas depressões e vargens!

São áreas brejosas, úmidas, pântanosas, com charcos e turfas. O Campo de Santana, quem diria, também era uma área úmida. A Convenção de Ramsar - Convenção sobre Zonas Úmidas - Ramsar, Irâ, foi criado em 1971, para proteger esses ecossistemas tão importantes. Disponível em: http://www.ramsar.org/. O Brasil só ratificou a convenção em 1993 (?). Embora seja um dos países mais ricos em superfície com tais características, quando comparamos as áreas protegidas no Brasil com áreas úmidas de outros países, percebe-se que há muito por fazer ainda. Existem claros enormes sem qualquer amparo maior. Em vez de muitas marrecas e peixes, as últimas cheias e chuvas nos deixaram dívidas já acumuladas e há necessidade de contrair outras mais, para pagar novos móveis, sofás e colchões. Vamos gastar mais em remédios, aumentar as faltas ao trabalho, as interrupções das aulas, os gastos com a defesa civil, com indenizações, aluguel social, perdas de monumentos históricos.

É certo que precisamos fazer algo agora!. Mas ninguém pode viver eternamente em emergência e situação de calamidade pública! Qual a solução? Retirar todas as casas das áreas de risco e transferir as famílias para áreas seguras, que não “briguem com as marés” ou com os rios.


Precisamos respeitar - rigorosamente - as áreas de preservação permanentes (APPs) e as reservas legais, entre outras. Em alguns casos - mesmo distantes de áreas protegidas - vai ser preciso construir “palafitas” - quem sabe batizar como "parapredios” - verificando-se qual a altura adequada dos pilotis. Não é construir espigões! No máximo, dois ou tres andares, como já se faz nas "favelas". Mas, entre eles deveria existir uma rua de "árvores" frondosas, nativas, para sombrear e refrescar o entorno e não virar um forno crematório de blocos de concreto num país tropical! (Que absurdo!). Não vou falar nem das questões de aumento do nível dos mares. Se os parapredios resolvessem as questões regionais, já estaria de bom tamanho. E o que fazer nas áreas que vão ficar ociosas, por baixo das edificações sujeitas a alagamentos? Sugestões: podemos cultivar hortas de ciclos rápidos, orgânicas, plantar arbustos medicinais e incentivar a fitoterapia e a cosmetologia.

Quem sabe, criar peixes e anfíbios - oriundos da própria bacia hidrográfica? Incentivar atividades e práticas que não representem perdas consideráveis, em caso de alagamentos. Aprender a construir pequenos barcos, oficinas de artesanato, produção de embutidos defumados para uso familiar (que resistem bom tempo sem estragar e sem precisar de geladeira), compotas e geleias. As lajes podem ser aproveitadas para a instalação de aquecedores solares e placas para gerar energia e coletar água da chuva - pelo menos para manter uma família por algum tempo. Pesquisar métodos rápidos e baratos para filtragem e esterilização de água. É muito provável que já exista – em alguma universidade brasileira – uma área piloto para testar essas soluções em conjunto. Precisamos pensar sim em vias alternativas. Precisamos de um plano “B” !. Urgente! Construir cidades subterrâneas é muito caro, mas pode ser uma opção – ainda mais aqui no Brasil, onde não existem grandes abalos sísmicos. Por enquanto, podemos respeitar o traçado dos rios, acatando a legislação vigente, retirando as moradias de suas margens e restaurando a sua mata ciliar. Não permitir também as construções em áreas inclinadas (salvaguardar vidas), restaurar e preservar áreas de mananciais, manguezais e margens de lagoas (de interesse humano direto, para fauna aquática, plantas e demais organismos). Isso tudo tem um valor econômico e social, porque essas áreas produzem "peixe de graça" que alimenta quem nem sempre tem dinheiro para comprar um badejo ou uma garoupa. É economia que faz falta no bolso de quem não tem muito. É difícil perceber essa realidade numa Avenida Paulista (São Paulo) ou na Avenida Rio Branco (Rio de Janeiro). Mas o país é imenso!. O que ajuda a resolver - ao lado de outras medidas - é lambari mesmo, cará, traíra, barrigudinho. No, entanto, a produção marinha está comprometida. A captura mundial de pescado in situ está eliminando jovens peixes. Não está havendo reposição de adultos para as gerações futuras! O mercado das gastronomia com "frutos do mar" será seriamente afetado, em pouco tempo. Isso sem falar no "caldo plástico" que pode ser encontrado em diversos pontos de diferentes oceanos. Turistas não desejam ver tartarugas "entupidas" com sacos plásticos. Vai ser um horror! Se o turismo é um caminho, precisamos entender quem estará conosco nessa empreitada. São nossos "colaboradores" biológicos. Sem eles não haverá nada interessante para se ver ou para se comer: biodiversidade. Não temos a cultura milenar da Europa como diferencial. Mesmo que a piscicultura continental venha oferecer uma opção de reposição, as águas onde serão produzidos precisarão estar livres de agrotóxicos, fertilizantes excessivos das culturas, drogas químicas e antibióticos.


Custa caro retirar micropoluentes da água para dessedentação e outros usos mais nobres. Temos que investir muito na cultura do "peixe orgânico". Temos que zelar pela qualidade da água dos rios e dos mares onde eles se criam "naturalmente" (in situ), ou em cativeiro (ex situ). É um verdadeiro tesouro a ceu aberto!. É só ir buscar e ter algum esforço para localizar, coletar, conservar e trazer. Não é necessário desmatar. Fala-se em "boi verde" - que mesmo com todos os cuidados - causa desmatamento. Por que não falar no "peixe azul" ? Isto é, um peixe cuja coleta não "destrói" seus estoques genéticos e suas futuras gerações?. Por que o desenvolvimento sustentável só fala do que poderá acontecer com humanos? E o que será das plantas e dos animais, que nos alimentam e nos prestam uma infinidade de serviços? E o que dizer dos outros organismos? Por que as bactérias são tão odiadas? Como não reconhecer isso como um poderoso fator econômico indispensável a ser "tratado com seriedade" ? Sei que não são tarefas fáceis de serem "praticadas", e muitos motivos serão alegados.

Mas com certeza, cada dia que sustentarmos posições insustentáveis e adiarmos nossas decisões mais inteligentes, estaremos também acumulando mais prejuízos futuros. Alguém vai pagar essa conta lá na frente!. É o que está acontecendo agora, porque não fizemos o dever de casa no passado.! Estamos vendo as encostas serem tomadas por construções que são verdadeiras armadilhas de morte. A ocupação - mesmo ordenada – tem que ser devidamente mapeada, e não podemos aceitar situações de alto risco. A engenharia ambiental – como o próprio nome indica – deve respeitar as exigências “ambientais”; observar a natureza, seus movimentos e ciclos. Aprender com ela. Não significa deixar de enfrentar desafios de cálculos matemáticos em áreas mais complicadas. É questão de bom senso e reconhecimento de forças poderosas, que não são as econômicas. Enquanto isso, lá no norte do mundo, a água endurecida e os ventos causam prejuízos astronômicos. E nós aqui, vamos tentando aprender como lidar com a forma líquida, livre e solta, nos rios, nas baixadas, no litoral. O mesmo nível dos mares que nos traz tanta alegria – nas praias maravilhosas do país - pode também travar o retorno rápido dos rios para o mar. E nessas horas, morar numa palafita (parapredio) pode ser uma solução “troglodita”, mas altamente oportuna, ecologicamente correta, eficiente e eficaz. Rios e marés continuarão a subir e a descer. São fenômenos naturais e necessários ao equilíbrio de forças imensas, maiores do que a nossa criatividade eventual; e todo o nosso lastro de ouro, ou de qualquer papel moeda.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Os cemitérios aquáticos: por que estamos matando os nossos rios?



Roberto Rocha

Quando leio as notícias sobre aquecimento global é muito raro que não haja, em cada uma delas, uma explicação sobre os impactos econômicos previstos ou já acontecidos. Gostaria muito que nessas oportunidades fosse enaltecida a importância protetora da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas associados. A conotação é mais voltada para os possíveis prejuízos na “produção humana” e o empobrecimento da economia. Fala-se pouco sobre os benefícios “naturais”: aqueles que não estão incluídos nos cálculos convencionais, conhecidos como bens ambientais ou bens difusos.
Embora eles possam prestar serviços relevantes à sociedade, não me parece que haja uma contrapartida - por parte dela ou o poder público – no sentido de preservá-los como algo indispensável e insubstituível. Imagine alguém falar sobre “pagar a um vegetal” por nos oferecer oxigênio? Ou “pagar aos rios e às nuvens”, por nos oferecerem água? Ridículo!? Não exatamente. Sabendo que eles – os vegetais, os rios e as nuvens, entre outros -, não têm uma conta bancária para fazermos os depósitos diários dos serviços que eles nos prestam, rigorosamente em dia. Deveríamos, ao menos, cuidar melhor deles. Mas o que vemos por aí? Rios mortos e esquecidos ao tempo, ou em suas sepulturas de concreto armado, sem direito nem mesmo de serem “redescobertos” para a retirada dos ossos. Os rios moribundos nos causam uma certa ogeriza e não costumamos fazer muita coisa por eles.

Muita gente deseja que sejam definitivamente enterrados, para esconder a lama e abafar o cheiro. Em relação aos rios mortos, você passa em cima deles e nem sabe que ali é um cemitério aquático: sem a mata ciliar, sem lontras, sem jacarés, sem cágados, sem rãs, sem pererecas, sem peixes, sem caramujos, sem barata d`água, sem lavadeiras, sem caranquejos e pitus, e tantos outros. Muitas crianças do século XXI não conhecem um rio de verdade. Os animais então, só aqueles da TV, do zoológico, de um livro ou revista. E assim, vamos lendo as reportagens sobre as questões globais sem dar conta que estamos cercados de questões locais, tão próximas.
Não podemos parar o aquecimento global, mas podemos revitalizar um pequeno rio. Protegê-lo dos esgotos não tratados. Quem mora no interior e tem um rio em sua propriedade, bem que poderia ajudar para que ele voltasse a ser o que era há 50 ou 100 anos. Quem sabe plantar as essências florestais que o seu avô falava tanto? Poderemos, de novo, tentar pegar um pitu (camarão de água doce) ou um caranguejo de rio? Cair sentado na água gelada e rir muito com as calças molhadas. Precisamos resgatar a vida natural, os hábitos saudáveis, para não correr o risco de fazer parte de uma população doentia e insana das próximas décadas, por não poder reconhecer mais a natureza em nós mesmos ou através dos nossos sentidos. O cérebro humano precisa de uma grande variedade de formas e cores para ser saudável: precisa de diversidade. Sem riqueza, corroída pela erosão genética, somos apenas uma câmera um pouco mais sofisticada, registrando a monotonia dos viciados padrões tecnológicos, imitadores da genialidade natural de Gaia. Reflita!

domingo, 21 de novembro de 2010

Anfíbios ameaçados, nós também

Roberto Rocha

Existem mais de seis mil espécies de anfíbios no mundo. Esses vertebrados são popularmente conhecidos como sapos, rãs, pererecas, salamandras e cecílias e somam mais de 800 espécies no Brasil. Algumas delas foram descobertas recentemente e muitas outras permanecem desconhecidas. Pelo fato de serem, muitas vezes rotulados de nojentos e pegajosos, boa parte da população ignora os benefícios que os anfíbios nos oferecem. Por exemplo, prestam serviços sanitários relevantes ao capturar insetos e outros invertebrados que podem atuar como vetores de dezenas de doenças que afetam seres humanos e outros animais. Teríamos muito mais pessoas internadas com doenças tropicais se os anfíbios não existissem.

Se considerarmos a quantidade de inseticidas que a espécie humana já produziu (e continua produzindo), contaminando os mais diversos ecossistemas da Terra, chegaremos a números astronômicos: por que não usar inseticidas naturais - e comprovadamente eficientes - para controlar os insetos adultos? Eles já existem e não precisam ser criados por biotecnologia. A natureza já pesquisou para nós! Sapos, rãs e pererecas são biocidas especializados. Eles matam os insetos para comê-los! Com uma grande vantagem: não contaminam o solo, as águas e nem os nossos alimentos. No entanto, devido ao fato de dependerem da boa qualidade das águas para suas posturas e desenvolvimento da fase larvar (girinos), os anuros podem ser afetados devido à poluição resultante de atividades humanas, as mais diversas.
Dados da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, 2008) mostram que mais da metade das espécies de anfíbios do mundo carecem de informações mais detalhadas quanto a sua biologia. (Disponível em: http://www.iucnredlist.org/amphibians/updates_2008. Acesso em: 26 set. 2009). A notícia é preocupante porque esses animais são também indicadores vivos da qualidade dos ecossistemas úmidos e florestas, ajudando a detectar poluentes nas bacias hidrográficas, muito antes que afetem os humanos. Dessa forma a extinção dos anfíbios representa a perda de um importante aliado na conservação de vidas humanas. Se eles estão ameaçados, nós também estamos. A Comissão de Sobrevivência de Espécies (SSC) da IUCN vem solicitando o empenho de todos os pesquisadores interessados nesse grupo para tentar reverter a crítica situação atual.

Muitas espécies estão sofrendo – na pele - os impactos da poluição industrial e perda de seus habitats. Algumas se distribuem em vastas áreas e estão protegidas em unidades de conservação (UCs), enquanto outras são muito raras e não estão em nenhuma área protegida, precisando de atenção urgente. Outras ainda só vivem em áreas específicas e em nenhuma outra mais. Esse fenômeno é conhecido como endemismo e cada caso precisa ser avaliado por especialistas nesse grupo zoológico. Se esses anfíbios desaparecerem perderemos também chances futuras de pesquisas importantes. Só este fato já seria um forte argumento para preservá-los. Esses recursos são nossos e existem em nosso próprio território.

ANURA

Entre os anfíbios brasileiros da ordem ANURA, as rãs são conhecidas pela elevado valor biológico de sua carne sendo comum a recomendação de sua ingestão para as pessoas debilitadas. A rã brasileira nativa mais caçada é a GIA ou RÃ-MANTEIGA (Leptodactylus ocellatus) (Foto por Cláudio Dias Timm), ainda encontrada em alguns brejos do interior, tendo quase que desaparecido da periferia das grandes cidades. Apesar de sua rica diversidade, o Brasil consome a RÃ-TOURO-GIGANTE (Lithobates catesbeianus) ou (Rana catesbeiana), uma espécie alienígena (americana do norte) criada em cativeiro e vendida congelada em supermercados mais sofisticados. A espécie tem sido encontrada também em vida livre no Brasil. Representa uma ameaça para outros anuros indígenas.



Já o sapo mais famoso do Brasil é o CURURU ou SAPO-BOI. Esse grande bufonídeo é conhecido cientificamente pelos sinônimos (Bufo marinus) ou (Chaunus marinus) ou (Rhinella marina) (Foto por Paulo S. Bernarde). Não é raro surpreendê-lo sob algum poste de luz forte, a espera de besouros e outros insetos, que ele come com avidez. Tem causado alguns transtornos como espécie invasora em outros países onde foi introduzido, por exemplo, na Austrália.



Entre os anfíbios menores destacam-se as pererecas, geralmente de cor esverdeada e hábitos arborícolas. No entanto, algumas espécies preferem o piso das florestas como é o caso de Adelphobates, um dendrobatídeo amazônico (Foto por Paulo S. Bernarde), cujas cores de advertência não estimulam a sua captura por predadores naturais.






URODELOS

Salamandras são espécies da ordem dos URODELOS (CAUDATA) com hábitos aquáticos ou terrestres. A espécie brasileira é terrestre, da família Plethodontidae.


Seus indivíduos respiram pela pele e não possuem pulmões. Não há forma larvar e os indivíduos desenvolvem-se a partir de “miniaturas” dos adultos. O gênero Bolitoglossa (Foto por Paulo S. Bernarde) está atualmente representado por uma única espécie amazônica no Brasil, mas é muito provável que novas descobertas venham aumentar esse número nos próximos anos.

GYMNOPHIONA


Cecílias são anfíbios da ordem GYMNOPHIONA de hábitos fossoriais, pouco conhecidos da ciência. Não possuem membros e, a primeira vista, parecem um grande verme (Foto por Paulo S. Bernarde). Alimentam-se de minhocas, cupins e larvas. Existem cecílias ovíparas cujas fêmeas cuidam dos ovos e outras são vivíparas. Vivemos a fase inicial de nossa vida dentro de uma bolsa líquida, como anfíbios dependentes da água. Somos um pouco parecidos com eles nesse aspecto e, se estão ameaçados, também nós devemos nos preocupar com o destino dessas incríveis criaturas.

sábado, 20 de novembro de 2010

O pré-socrático Thales: a água como elemento primordial

Roberto Rocha

Se voltarmos na história, vamos nos deparar com um incrível filósofo que falava de física alguns séculos antes do nascimento de Cristo. Esse “fisicalista” tentava conceber o mundo a partir de um elemento natural muito conhecido, substância simples e ao mesmo tempo tão necessária: a água.

O pensador Thales foi um dos sete sábios da Grécia e dominava conhecimentos importantes aprendidos na Babilônia: astronomia e meteorologia, o que lhe permitiu destacada atuação na agricultura, conforme contam as conversas da época, nem todas acompanhadas de uma razoável credibilidade. Valorizou a importância da água, num tempo onde ela era pura no mundo hidrosférico, ainda sem revolução industrial. A água seria o princípio de todo o universo. Sua capacidade de mutação, ora nas nuvens, ora num rio, ou mesmo compondo o nosso corpo, faria dela um elemento mágico.
Depois de muitos séculos, estamos vivendo um momento crítico que nos faz lembrar de Thales, que dizia: “tudo é um”, e a razão é uma extensão da natureza. Muito incrível esta afirmação! Com base nesta genial sacada, devemos considerar seriamente tudo o que estiver envolvendo a água na atual cultura consumista globalizada, já que ela pode estar em diferentes locais de uma hora para outra.

Seu valor econômico passa a ser estratégico num sistema competitivo com o qual infelizmente fomos forjados. É possível que, de modo equivocado, muita gente pretenda entender a natureza como competitiva também. Não é verdade! A natureza é cooperativa. Ela é inteligente. Quem é inteligente sabe valorizar as forças que o cercam e as usa de modo adequado para a causa principal: a evolução. Como seres vivos que somos, como ambiente que somos, não podemos compreender a água como apenas um elemento isolado, como uma “coisa” a ser apropriada num momento “x” da produção e depois, ser descartada sem maiores cuidados e preocupações com o seu futuro. Parece estranho falar de saúde da água?

Ou melhor qualidade da água? De sua disponibilidade natural? Sabemos muitas coisas sobre potabilidade e balneabilidade: mas apenas para os humanos? Na praia vemos a placa: PROPRIA! Ou então: IMPRÓPRIA!. Para quem? Para os peixes? Para os moluscos? Para os crustáceos? Para os equinodermos (estrela-do-mar)? Para os celenterados (água-viva)? Continuamos a cultivar o antropocentrismo da idade moderna. Somos o centro. Tudo deve girar em torno do homem. Nossa população passou dos limites naturais e agora invadiu as terras de todo o planeta. Cada povo, em suas conquistas e explorações, costuma levar com ele as espécies com as quais está familiarizado e com isso introduz criaturas exóticas onde elas não deveriam estar. Espécies nativas são exterminadas ou suas populações sofrem baixas irrecuperáveis.
Outras são rapidamente substituídas por convicção econômica. Perdemos insubstituíveis genomas. Estamos perdendo agora a estabilidade físico-química das bacias hidrográficas e das águas subterrâneas. O mundo quer água. Precisa dela, urgentemente. Rinocerontes africanos estão sendo translocados de um lugar para outro, para não morrerem de sede em suas áreas naturais. Uma em cada cinco lavadeiras (ordem Odonata, Insecta) na região do Mediterrâneo está ameaçada por escassez de água. Para onde foi a água? Os animais estão precisando de água: os selvagens. Eles não geram lucros rápidos e ficam em segundo plano no atendimento, dependentes de verbas governamentais, da atenção política para o seu papel ecológico num mundo de homens e corporações que se expandem cada vez mais. Preocupante a informação que anuncia a quebra da barreira dos nove bilhões de humanos no planeta, por volta de 2050. Somos eficientes armazenadores de água circulando por aí, como mini-oceanos ambulantes hipossalinos. Precisamos parar para pensar como hidratar tanta gente, com a insubstituível água.

Uma pessoa adulta de 70 quilos retém em seu corpo cerca de 40 litros de água durante sua vida, até que morra. Quando isso ocorre, a água é outra vez liberada para retornar ao ecossistema. É possível que uma boa parte se infiltre no solo. Outra parte dela deverá compor o corpo dos decompositores e demais organismos associados a eles que vão se multiplicar a partir da matéria sem vida. Isso tudo sem contar a água que vai para a atmosfera.Se imaginarmos que o mundo fosse constituído somente por humanos com 70 kg de peso, nós estaríamos retendo - em 2050 -, cerca de 360.000.000.000 (trezentos e sessenta bilhões de litros de água). Isso, sem contar a água usada para banho do corpo, escovação dos dentes e lavagem da boca, lavagem de alimentos, cocção de alimentos, lavagem de roupa, descarga de banheiro sanitário, lavagem de carros, lavagem de calçadas, cuidados com plantas e jardins (as plantas também retêm água) e tantos outros usos. Nos oceanos flutua uma infinita quantidade de seres microscópicos cujos corpos não são visíveis aos nossos olhos. Se pudéssemos vê-los teríamos a sensação de uma mancha de vida quase que contínua em vez de ondas de “água”.

A produção de alimentos é também um imenso sumidouro de água. Considerando que a pecuária brasileira representa hoje um dos pilares do nosso desenvolvimento econômico, resta-nos não descuidar das nossas bacias hidrográficas A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) elaborou um folder (dezembro de 2005) que ajuda um “fazendeiro” a estimar o consumo de água com humanos, suínos, aves e bovinos numa propriedade rural. Por exemplo, cada humano consome cerca de 180 litros de água por dia em suas rotinas mais comuns. Se numa fazenda trabalharem 50 pessoas, elas gastarão cerca de 9.000 (nove mil) litros de água num só dia. Um bovino de corte com 566 kg gastará 46 litros de água por dia. Isso significa que num plantel com 5.000 bovinos, eles consumirão cerca de 230.000 (duzentos e trinta mil) litros de água a cada dia. Cada vaca em lactação, por sua vez, consome muito mais, exigindo cerca de 62 litros de água por dia. Suínos entre 157 e 230 dias consomem 20 litros, diariamente. Nesses cálculos não foi incluída a água usada para a lavagem das instalações. Entenda que, na maioria dos casos, são necessários alguns meses até que o produto final chegue ao consumidor. Enquanto isso, haja água...

Cada quilo do que chamamos de carne representa “um pacote” de água com alguns nutrientes organizados geneticamente. O Brasil é um grande exportador de água para os países onde ela começa a ficar escassa. É um de nossos grandes trunfos econômicos: o nosso ouro líquido. Não precisamos usar nenhuma tecnologia mais sofisticada para chegar até ela. Basta se abaixar e beber. Basta encaminhá-la para onde desejamos.
A questão principal é que a água, assim como os demais componentes de qualquer ecossistema, precisa ser cuidadosamente monitorada, de modo a não desviá-la para propósitos exclusivamente econômicos, causando desequilíbrios irrecuperáveis à saúde ambiental. A água que vive aprisionada em todos os seres do mundo, unicelulares e pluricelulares, representa um recurso estratégico incomensurável.
Nós somos água, gostando ou não da idéia. É meio estranho saber que quando estamos sentados numa cadeira de executivo, determinando a vida e a morte, através de nossas decisões rotineiras, sejamos tão líquidos e tão descartáveis. Tão logo acaba a troca gasosa, o nosso código genético deixa de ter o controle de nossa estrutura corpórea organizada e nós nos desmantelamos nas partes que devem voltar para cada um dos reservatórios do planeta. O Ganges que o diga...

Numa bactéria, numa planta, numa nuvem ou num rio, vamos continuar nossa missão ecossistêmica; disfarçados e irreconhecíveis. Fomos educados e condicionados a ver água como um bem líquido que nós apenas usamos ou pagamos para que chegue até as nossas casas, sem considerar qualquer conotação pessoal. Thales estava certo: a água é a razão de tudo! Precisamos “beber” o corpo de alguém, todos os dias para viver. Talvez, se pensarmos dessa forma, quem sabe nós tenhamos um maior cuidado com o que restou de nossos antepassados?